- Mainha, o céu tá é preto de chuva!
- Não diga isso, minha filha, que é pecado!
- Mas ele tá preto mesmo, olha lá!
- Minha filha, não se pode dizer que o céu tá preto. Lá é a casa de Deus!!!
Gente! Imaginem isso dito para uma criança??? Seria cômico se não fosse trágico, não é mesmo?
Pois é. Pensando nessa campanha da #Infância Sem Racismo comecei a pensar sobre que momentos de racismo presenciei na minha infância. E vi que foram muitos.
Filha de uma família muito misturada, como toda família brasileira, sou a única “desbotada” entre todos os meus seis irmãos (tenho que ficar indo direto para o sol pra “segurar o bronze”, do contrário, fico parecendo anêmica. Quem já viu??). Quando crianças nossa mãe nos levava para aqueles salões de beleza e tínhamos que passar por aqueles processos de “amansa a juba” - que eram um saco! E, muitas vezes, saíamos de lá com nossa cabeça ferida, tamanha química que usavam. Nessa época não havia controle sobre o tipo de produto que era utilizado nas crianças, como agora. E eu achava tão estranho sentir meu cabelo fininho, leve... me dava a impressão que ia soltar da cabeça e sair voando por aí. Vai ver que é por conta disso que criei uma certa aversão a esses estabelecimentos, hoje só vou em último caso, mesmo. Não me sinto à vontade, as conversas que circulam por lá me incomodam – o mesmo para o som e os vídeos. Arg!!!! E as revistas?! Só caras, quem e coisas do tipo, quando chego lá com um livro ou jornal parece que sou uma extraterrestre. Mas enfim.... faz parte do mundo moderno.
Adorei quando a minha irmã, um ano mais velha do que eu, revoltou-se e deu seu grito de libertação: “abaixo o alisamento!!!” e passou a assumir os cachos e a cuidar deles com esmero. Eu fui beneficiada “por tabela”.
Ela, certamente, sofreu mais preconceito do que eu. Eu era mais “desbotada” e com cabelos mais “finos”. Lembro que num determinado trabalho, numa ONG, diga-se de passagem, onde pensamos que essas coisas estão superadas, tinham pessoas que não aceitavam o tipo de cabelo dela. Criticavam e viviam dando pitaco para ela “acalmá-los”. Massa que ela não dava ouvidos e procurava espaços que tratavam e respeitavam os cabelos dos negros e negras.
Sempre engajada nas discussões sobre direitos e igualdade ela foi, assim, mostrando para o mundo que não tinha nada que se envergonhar, nem da cor (que é belíssima!! Eu mesma morro de inveja daquela cor) e muito menos dos cabelos. Isso sem contar em tantas outras situações que não vou citar aqui, porque nem conversei com ela pra saber se ela se importava que compartilhasse isso com vocês. Basta dizer que no trabalho que exercia, e ela é advogada, em salões de beleza, com a família e demais espaços que freqüentamos a pressão é imensa.
Há uma dificuldade mesmo, ela é real e não camuflada da não aceitação ao que foge à regra. E a regra é: mulher (bonita) tem que ser branca, com cabelos lisos e loiros. Minha irmão é negra, com cabelos escuros e cacheados. Hoje eu percebo o quanto ela não deve ter sofrido ou mesmo se incomodado com isso. Que bom que ela fez o que a socióloga Vilma Reis vive dizendo: “negro tem que andar com o bico na diagonal!” e hoje ela é minha referência em vários sentidos. Parabéns minha irmã pela mulher corajosa, decidida, que se respeita e respeita @ outr@. Fico feliz e orgulhosa por ser sua irmã.
E ainda tem gente que acredita que no Brasil não há preconceito. Mas sobre isso falaremos noutro post, tá?
Pois é, eu tb presenciei vários..fico de cara, é um absurdo...adorei seu post! Beijos
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